AMOR
ADIADO
Quando eu tinha uns seis
anos, saindo de um teatrinho infantil, disse à minha mãe
que eu não queria
estar “aqui” e sim “ali”, apontando para o palco.
Acho que ela nem entendeu o
que eu quis dizer.
Aos doze ou treze anos,
repeti minha vontade, desta vez sendo mais
clara: “quero ser atriz”.
Sua resposta foi: “filha
minha só vai ser puta por cima do meu cadáver”.
Naquela época, atrizes ainda
eram consideradas “um pouco prostitutas”; a carteira
de trabalho era igual.
E minha
mãe era radical em suas opiniões, então tratei de criar outros sonhos.
Em minha
família não tinha nenhum artista, nem professor de nada.
As mulheres foram
criadas para casar...
Cresci, viajei muito, casei
muito jovem, tive filhos muito cedo.
Morei em mais casas e cidades das que
posso lembrar.
Não lembro do nome de professores porque muitas vezes, em dez
meses,
começava o ano letivo num país e terminava em outro.
Não tenho amigos de
infância, porque não dava tempo de fazer AMIGOS.
Esqueci muita coisa daquele
tempo.
Fiz um curso de secretária executiva e acabei arquivando o sonho de atuar.
Aos 44 anos, por convite de
uma amiga, acabei indo fazer um “cursinho de teatro”.
Era só uma brincadeira
porque o sonho estava meio esquecido também.
Fizemos uma peça, atuei mal pra
caramba, mas me apaixonei pelo palco.
Foi amor no primeiro pisar naquelas
tábuas.
Depois mais alguns cursos e a adrenalina e o amor só cresciam!
A vida me pregou algumas “peças”
– que ironia da palavra! – e tive que parar
inúmeras vezes; o marido ficava
doente, uma irmã precisando ajuda, enfim;
vida real chamando.
Quantas pessoas – algumas muito
talentosas- não passarão pelo mesmo?
Que triste isso, seja para o sonho que
for! “Adiar o sonho”.
Sou rotulada de inconstante
por algumas pessoas que sabem pouco da minha vida.
Às vezes sou mesmo: eu mudo
de rumo, altero meu destino, desisto do que não me
cativa por inteiro. Só sei fazer as coisas com paixão avassaladora.
Mas o sonho
de ser atriz grudou na pele e disso eu não desisti.
Não sei se tenho talento,
não sei se tenho vocação, mas amo profundamente minha profissão.
Fiz cursos
sempre que pude e hoje estou integralmente dedicada à arte de atuar.
O teatro é um templo... Ali não
entra pipoca, graças a Deus!
O palco é sagrado e nele sempre piso com o pé
direito pedindo licença antes de
pisar nas tábuas.
Antes de entrar em cena o
estômago embrulha e o coração vai explodir.
Juro que vai. E no final, explode. De
alegria, êxtase e contentamento.
Pensando bem, acho que isso
é FELICIDADE.